Como ficou de alguma forma prometido, aqui fica uma perspectiva escrita e ilustrada de uma visita ao Cabeço Santo, em pleno mês de Maio (dia 11), mês das flores, das cores, da exuberância…
Mas, ainda antes de atingir as cotas mais elevadas do cabeço, pelo caminho florestal que parte da estrada para Agadão, uma nota sobre o oposto (ao esperado). Primeiro, um eucaliptal completamente invadido com Acacia melanoxylon, uma visão apesar de tudo pouco vulgar, mas que deixa uma forte impressão. Pouco acima, uma visão que vai sendo cada vez mais vulgar, embora não dominante: um eucaliptal onde o matagal foi eliminado por aplicação de herbicida. Um verdadeiro deserto com árvores.


Mas logo entramos na Mata da Altri Florestal e na área de intervenção do projecto, embora numa zona onde praticamente nunca se realizou trabalho. O panorama não é, contudo, completamente desanimador: numa área nunca verdadeiramente explorada, por marginal, os eucaliptos presentes serão todos de origem seminal, e os medronheiros, que sempre lá estiveram, vão coexistindo como podem… Estamos no vale nº 1.

Mas é no vale nº 2 que as coisas se animam. Logo ali um Halimium ocymoides, à justa ainda apanhado com flor, pois em geral perdem já as vistosas pétalas. Depois, uma perspectiva geral desta zona do vale, onde as áreas estritamente rupícolas se combinam com o matagal e o medronhal.



Logo ali uma umbelífera muito característica destas áreas, mas que não sei chamar pelo nome… A seguinte, sim, o tojo mais abundante aqui em cima, a Genista triacanthos, que agora cintila de amarelo.


Embora não tão aprazível, não deve ser omitida uma observação das áreas de acácia-de-espigas que por aqui ainda existem. Aqui se trabalhou sobretudo nos primeiros anos do projecto (2007-2009), mas depois ficaram desatendidas, e eis o resultado… Claro, há que voltar aqui algum dia!


Mas, para compensar esta visão preocupante, logo a seguir outra bem mais reconfortante: uma das flores mais raras e elegantes do cabeço, que é necessário procurar bem (e no momento certo) para se poder observar. Aí está ela, a erva-língua, a única orquídea desta paisagem e de certo modo um símbolo do Cabeço.

Muito mais fácil de observar, e repleto de insectos, é o rosmaninho, que se encontra por vezes quase sobre as rochas, e que é também uma planta virtualmente inexistente fora destas áreas de conservação.

A seguir vale a pena admirar uma árvore que é um exemplo notável da tenacidade nesta paisagem difícil para as plantas de maior porte: um sobreiro, mas um sobreiro especial: única planta deste porte num raio de várias centenas de metros (exceptuando os eucaliptos), foi também a única planta desta área que recuperou a parte aérea depois do incêndio de 2005, ainda conservando algumas das suas cicatrizes. Recuperando e crescendo lentamente, apresenta agora uma copa densa e atractiva. Infelizmente, tem a companhia de algumas acácias-de-espigas. Um dia destes havemos de ir lá cuidá-la… e admirá-la.

Logo ali ao lado, domina contudo a vegetação rupícola, com toda a sua diversidade e beleza, de pequenas plantas capazes de sobreviver em condições muito frugais…









Uma das plantas do matagal mais bem distribuídas é o sanganho-mouro (Cistus salvifolius), cujo pico de floração já passou: aproveitemos para admirar as últimas deste ano, e também uma planta bastante abundante nas bermas dos caminhos, mas que ainda não foi identificada (P.S.: um voluntário identificou-a entretanto como Sesamoides purpurascens):



Mas, não se pode atravessar esta área sem voltar a atentar na sua principal ameaça: a acácia-de-espigas. Ali, um pequeno canteiro, onde um número elevado de pequenas plantas ocorre: sem dúvida, plantas de origem seminal. Mas, dois minutos bastaram para as remover. Dois ou três anos depois seria impossível. A sério, temos de voltar a esta área de vez em quando…


Não longe daqui, um dos limites de propriedade mais bem demarcados de toda a região: a extrema entre a mata da Altri e a propriedade da Quercus! Uma “fortificação” em pedra, a fazer lembrar a grande muralha da China! E, cúmulo do espanto, vigiada por um guarda (conseguem vê-lo?!).

Mas voltemos às acácias: seguindo para o vale nº 3, a coisa fica mais “preta”: arbustos de elevado porte, e, mais uma vez, muita germinação de sementes, mas desta vez por razões fáceis de levantar: uma máquina passa por aqui de vez em quando para arranjar o caminho, e a perturbação do solo é o “fósforo”… As vagens deste ano, é claro, já são bem visíveis.


Convém olhar um pouco mais para longe: do outro lado do ribeiro, a preciosa área de Vale de Barrocas, ainda “em construção”…

De vez em quando encontram-se exemplos interessantes de “convivência” entre espécies nativas e invasoras,… ou será mais um cerco?!


Uma visita à cabeceira do monte permitiu apreciar os carvalhos aqui plantados há alguns anos pela Altri Florestal, numa área que já esteve densamente ocupada por acácia-de-espigas: a taxa de sobrevivência não foi elevada, mas as árvores que sobreviveram lá vão fazendo o seu caminho, crescendo devagar. Claro, nada que se pareça com um eucalipto!

Já do outro lado da cumeada do Cabeço Santo, surge de repente um cenário impactante:


É difícil não sentir, não sei, um arrepio, uma angústia, um sentimento de… deve, tem de haver uma maneira melhor, mais harmoniosa, mais “leve” de obter da terra o que necessitamos dela, que não seja a vergá-la, a violentá-la segundo uma lógica que parece mais ser de morte que de vida. Ocorreu-me a história da galinha dos ovos de ouro…
Mas voltemos ao outro lado do cabeço, para apreciar o medronhal, agora já na cabeceira do vale nº 4. Esta área bastante extensa de solos marginais, mas com bolsas de solo mais fértil, tem muitos eucaliptos dispersos a necessitar de serem removidos e também manchas e plantas isoladas de acácia-de-espigas, mas o medronhal está também já bastante bem implantado.

Mais complicada tem sido a “história” do vale nº 5: muito trabalho já realizado, mas frequentes surtos de retrocesso: aqui, parece que nem os descasques de mimosa têm funcionado!


Ficou a faltar uma perspectiva dos Vales nºs 6 e 7, e também uma análise das cotas mais baixas, onde a “situação” é, em geral, diferente da das cotas mais elevadas.
Este “percurso” pelas cotas mais elevadas do Cabeço Santo tem também cabimento porque este ano decidiu-se não realizar a jornada anual de visita, prevista para 16 de Maio. Em vez dela, realizou-se uma visita de trabalho à zona ribeirinha, limitada aos corpos sociais da Associação Cabeço Santo e alguns voluntários mais comprometidos, mas de maneira a não exceder 10 pessoas…
Mas dessa visita e do que nela se planeou, haverá notícias em breve nas páginas deste blogue. E também das jornadas de trabalho voluntário que, com restrições, se planeiam já para finais de Maio.
Até breve.
Paulo Domingues
A planta não identificada poderá tratar-se da Sesamoides purpurascens ou a congénere Sesamoides pygmaea (mas que não creio) ou ainda talvez a Reseda phyteuma. Contudo deposito mais fé na primeira.
Muito obrigado Daniel. Buscando em sentido inverso e entre as que referes, também me parece ser a primeira.