A primeira jornada voluntária de Outono foi realmente a última do Verão, e, depois de uma semana com chuvas abundantes a anunciar o Outono, eis que o Verão se veio despedir com dois dias de céu límpido e temperaturas elevadas, um dos quais este Sábado, 19 de Setembro de 2015. Um dia antes tinham passado 10 anos sobre o traumático evento que deixou esta paisagem em cinzas, mas que de facto foi a força motriz da criação deste projecto. Ainda está pensado um artigo sobre esta “efeméride”…
10 anos depois, os sinais directos da calamidade vão-se apagando lentamente, mas, com cuidado, ainda é possível encontrar muitos: as manchas negras na cortiça de um sobreiro, uma mimosa queimada ainda em pé, ramos e troncos queimados ainda depositados no solo, tocos de árvores no solo que demorarão mais uma década a desaparecer… Mas os sinais estão sobretudo nas vegetação, na parte verde: em toda a presente área de intervenção do Projecto Cabeço Santo apenas sobreviveram em pé uma meia dúzia de sobreiros, algumas pequenas manchas de carvalhal e árvores isoladas, e um pequeno núcleo de medronhal, muito encaixado no vale nº 1. Todas as restantes árvores e arbustos numa vasta área têm menos de 10 anos.

Nesta jornada compareceram 9 voluntários, e o programa era ambicioso. Começámos, pela manhã e ainda frescos, por uma intervenção de corte de acácia-de-espigas na cabeceira do vale nº 2 (Vale de S. Francisco). Numa área que já esteve intensamente invadida, a presença desta espécie já é mais rarefeita que nos anos seguintes ao incêndio, mas como nos últimos anos se realizou aí pouco trabalho, as plantas existentes foram crescendo, e agora já não bastam tesourões para as cortar. Além disso, já produzem sementes abundantemente, enchendo o solo de pequenas “bombas”, que aí se mantêm quase inactivas até que um evento extraordinário (que oxalá não aconteça!) as “acorde” massivamente. Quanto à vegetação nativa, aqui ainda é dominada pelo matagal de pequeno porte e pelas gramíneas, que depois de um Verão longo e seco, emprestam tonalidades acastanhadas à paisagem. Aqui e ali, um medronheiro, um lentisco, incluindo os que foram plantados pelo projecto nos últimos anos, mas que se desenvolvem devagar. Não foi muito feliz a plantação do último Inverno pois a dura exposição e o Verão longo e seco ditaram a não sobrevivência de um número significativo de plantas.




Os trabalhos prolongaram-se com entusiasmo até ao meio dia, quando a equipa desceu um pouco o vale para colher frutos de lentisco. Destes frutos se obterão sementes que serão utilizadas na experiência de sementeira com bolas de sementes a realizar este ano. Depois foi o almoço na Casa de Santa Margarida. Ocasionalmente, quando não estamos muito longe, voltamos aqui, onde temos mesa, bancos e sombra!



À tarde atravessámos o ribeiro na aldeia em ruínas de Belazaima-a-Velha e fomos até à margem sul do mesmo, na encosta voltada para o vale nº 6, onde se têm aplicado intensos esforços. Aqui, na margem sul, ainda havia uma mancha de mimosas com alguns anos de crescimento, uma área contígua onde já se tinham cortado no último Inverno, mas onde ocorreu abundante rebentação, e uma encosta já bem preenchida de plantas nativas, mas onde as mimosas ainda vão aparecendo como cogumelos do sistema radicular superficial que ficou no solo. Então, pareceu que não tinha já havido uma manhã de trabalho. O grupo deu-se ao trabalho com tal dinâmica e determinação que numa tarde fez quase tudo o que aqui podia agora ser feito: cortou e arrumou mimosas médias, aplicou herbicida na superfície de corte, cortou rebentação, arrancou rebentos do sistema radicular superficial, e ainda descascou uma mimosa grande, a última que por aqui ia resistindo. O trabalho prologou-se até às 19 horas! Só ficou a faltar a limpeza do silvado mas esse é já um trabalho de motoroçadora, mais especializado.












E isto ainda não foi tudo: ainda houve tempo para observações! Sobretudo pelos olhos mais treinados do nosso biólogo de serviço, foi possível identificar um conjunto de espécies de aves, quer no monte quer na zona ribeirinha, algumas das quais ainda não referenciadas no Cabeço Santo. Eis a lista, com um obrigado ao Fernando:
No monte:
- Andorinhão-preto (Apus apus)
- Andorinha-dáurica (Hirundo daurica)
- Andorinha-dos-beirais (Delichon urbicum)
- Pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula)
- Felosa do mato (Sylvia undata)
- Toutinegra-de-cabeça-preta (Sylvia melanocephala)
- Toutinegra-de-barrete (Sylvia atricapilla)
- Melro (Turdus merula)
- Papa-moscas (Muscicapa striata)
No ribeiro:
- Pica-pau-malhado-grande (Dendrocopos major)
- Alvéola-cinzenta (Motacilla cinerea)
- Carriça (Troglodytes troglodytes)
- Chapim-real (Parus major)
- Chapim-rabilongo (Aegithalos caudatus)
- Estrelinha-de-cabeça-listada (Regulus ignicapilla)
E ainda não foi tudo: a equipa teve a felicidade de poder observar uma salamandra-lusitanica bebé!


Claro, só podia ter sido mais uma extraordinária jornada voluntária! A próxima, sim, será já em pleno Outono, com os companheiros da Montis, mas, é claro, aberta a todos. Créditos: este artigo tem fotos de Paulo Domingues, Sónia Serra e Abel Barreto. Obrigado!
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Grande equipa!!! Excelente todo o trabalho realizado. Vamos lá ver se consigo ir na próxima Jornada.
Parabéns por mais uma grande Jornada a toda a equipa e a mais um grande relato. Adorei o pormenor de juntarem a lista de observações no que toca à fauna.